Vacinas adaptadas para variantes são a próxima fase de combate à pandemia

Em meio à atual campanha de vacinação para conter a Covid-19, diversas estratégias de saúde pública foram desenhadas emergencialmente em nome da celeridade do processo e da proteção da população.

No meio do caminho, por exemplo, admitiu-se que alguns esquemas vacinais fossem concluídos com a combinação de imunizantes de fabricantes diferentes e a dose de reforço — já aplicada em quase 50 milhões de brasileiros — foi de expectativa a realidade em tempo recorde.

Nesse cenário, uma nova mudança de rota na vacinação contra Covid-19, começa a ser discutida e, mediante a necessidade, poderá ser adotada em médio prazo. Trata-se da adaptação de vacinas em uso para diferentes variantes do coronavírus.

O processo de adaptação, explicam especialistas, seria semelhante ao que acontece com as vacinas da gripe, anualmente atualizadas — sob orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS) — para agir justamente na proteção dos vírus em disseminação naquele período. Gustavo Mendes, gerente de medicamentos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), afirma que a atualização das vacinas é um tópico de discussão que ganhou força nos últimos tempos.

— Em um evento internacional, observamos os dados de quarta dose em Israel. E parece não ter tanta vantagem ficar dando doses de reforço (com a mesma formulação de vacina), ainda mais com a circulação da cepa Ômicron. Então, se fala cada vez mais na atualização das vacinas, na mesma perspectiva do que ocorre com a vacina da influenza — defende o especialista em imunizantes ao GLOBO.

Essa perspectiva sinalizada por Gustavo está alinhada com as movimentações recentes das farmacêuticas. A norte-americana Pfizer, por exemplo, iniciou no fim de janeiro as testagens de sua candidata a vacina desenvolvida a partir das especificidades da cepa Ômicron.

A farmacêutica estima que para o desenvolvimento de uma vacina baseada em uma nova cepa sejam necessárias seis semanas. Outros cem dias serão fundamentais para a produção do novo imunizante e, só então, iniciam-se os procedimentos regulatórios.

A Sinovac, farmacêutica baseada na China responsável pela CoronaVac, afirmou, em dezembro, que teria respostas sobre sua candidata contra Ômicron a partir de março deste ano. Também iniciou estudos do tipo a estadunidense Moderna, cujo imunizante não é utilizado no Brasil.

Dificuldades no caminho

A chegada de uma vacina adaptada não ocorrerá a tempo de interferir na definição brasileira acerca da necessidade de uma quarta dose de vacina aos idosos e profissionais de saúde. Isso porque, atualmente, a câmara técnica do Programa Nacional de Imunizações (PNI) já avalia o tema.

— Infelizmente não vai dar tempo de esperar a vacina adaptada para avançarmos nessa discussão. Neste momento, por exemplo, já estamos em observação da taxa de internações e mortes (dos idosos). Se já houvesse essa dose, para o mês que vem, seria interessante aguardar — afirma Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), um dos integrantes da câmara que baliza decisões sobre o PNI.

Em relação ao prazo, especialistas em imunização explicam que ter uma vacina adaptada viável, avaliada e aprovada por agências regulatórias, levaria, no mínimo, entre seis e oito meses. O cenário da oferta de um imunizante “repaginado”, portanto, seria, sim, positivo, mas uma estratégia a médio prazo.

— Se tivermos uma “folga” após a Ômicron, será o momento de pensarmos qual será a próxima etapa da vacinação. De maneira otimista, acredito que a atual onda, somada à extensa vacinação, nos dará uma janela nos próximos meses que nos permitirá pensar em políticas mais complexas de imunização — avalia Maurício Nogueira, virologista da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp).

Ele ressalta, porém, que medidas mais sofisticadas de controle da pandemia — como a adaptação das vacinas — têm , neste momento, menos prioridade do que uma distribuição igualitária de imunizantes pelo mundo.

Imunização igualitária

É na tecla da imunização global que também bate Sue Ann Costa Clemens, pesquisadora responsável por trazer ao Brasil o estudo do imunizante Oxford/AstraZeneca e autora do livro “História de uma vacina”. Ela diz que a versão adaptada deve tornar-se uma opção somente quando estiver claro que as vacinas em uso atualmente são ineficazes para proteger contra hospitalizações e mortes para Covid-19. O que, vale ressaltar, ainda não é realidade.

— Quanto mais estudos realizarmos, melhor. No futuro, (para o controle da pandemia) teremos que ter vigilância epidemiológica, com testagem e sequenciamento genômico das variantes. Se houver um escape grande da proteção, apertamos um botão vermelho e apostamos na vacina adaptada — diz.

As informações são do Jornal O Globo.

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