Avanço da imunização contra o coronavírus reaquece a rotina de flertes durante a pandemia

Renata Rodrigues descobriu por acaso que a segunda dose da vacina contra o coronavírus lhe daria mais do que a imunização. A jovem, de 23 anos, mora em Florianópolis e marcou o prefeito da cidade na foto postada no Instagram, mostrando o momento da agulhada.

O clique foi compartilhado pelo chefe do executivo e, consequentemente, alavancou a popularidade da moça na rede. “Vários contatinhos vieram falar comigo, no estilo ‘oi, sumida’. Mas também apareceram uns caras desconhecidos, que começaram a me seguir e puxar assunto”, conta.

A parte dos novos admiradores, ela confessa, não a deixou confortável. Mas, a quem interessar possa, ela manda avisar que o flerte da vacina é uma realidade incontestável. Tanto que tratou de incrementar a sua apresentação no Tinder com essa informação. Além de frases como “apaixonada por ciclismo” e “gosto de passear em supermercados”, adicionou: “agora já com duas doses no braço”. “Gera uma conexão e puxa uma conversa sobre a imunização”, diz.

A própria ferramenta de paquera está atenta a essa movimentação e lançou, na última semana, figurinhas personalizadas para que as pessoas atestem a imunização.

Segundo dados divulgados pela empresa, as citações do termo “vacina” aumentaram mais de 900% desde o início da pandemia.

No mês passado, conforme a campanha avançava no país, as menções a “vacinado” cresceram seis vezes e à “vacinada”, cinco, nas descrições dos perfis.

Usuária da plataforma, a designer Thalita Vieira, de 37 anos, acha ótimo. Além de se divertir com rapazes que postam fotos com cara de jacaré, afirma que os perfis que trazem essas informações ganham pontos com ela.

“Já fico feliz em saber que não é antivacina. Se vier com um ‘fora genocida’, melhor ainda”, diverte-se a moça, que receberá a sua segunda dose no próximo mês. “Já estou acompanhando a movimentação. Na hora que a vontade bater, vou buscar alguém com a imunização completa.”

Doutor em Epidemiologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Paulo Petry lamenta “jogar água no chope” dessa turma e adverte que ainda é cedo para tais saliências. “A vacina é uma grande aliada, mas não garante 100% de proteção. E agora, com a variante delta, considero precipitado esse tipo de encontro”, afirma.

Ele acrescenta que tampouco há como minimizar os riscos de maneira eficiente. Um encontro que envolve beijos e troca de saliva anula qualquer cuidado prévio.

Além disso, como lembra, não há como ter certeza de que o parceiro ou a parceira está se cuidando e até mesmo recebeu as duas doses do imunizante. “A garotada tem razão em estar ansiosa, mas ainda é perigoso. Com a nova cepa, temos visto muitos jovens adoentados.”

João usa foto da vacina em aplicativo Foto: Arquivo Pessoal

Feitos os alertas, o fato é que quem recebeu as duas doses tem se tornado um bom partido. Ao postar no Instagram a foto do momento em que recebia a vacina, a designer Clara Morais, de 25 anos, viu os seguidores serem “seduzidos” pela beleza do profissional de saúde (mesmo de máscara) que lhe aplicou o imunizante.

A imagem fez tanto sucesso que chegou até o rapaz, e o mesmo terminou por adicioná-la na rede. Os dois começaram a se falar e marcaram um encontro para esta semana. “Ele é médico e já recebeu as duas doses. Então, sinto-me mais segura”, diz, afirmando tratar-se de um convite irrecusável. “Mesmo se ele fosse feio, ia sair com ele. Pegar o cara da vacina é uma história incrível para contar.”

No meio da paquera pandêmica também há quem invista nas fotos de imunização como cartão de visitas, como foi no caso do estudante de Rádio e TV João Vítor, de 25 anos. Usuário do Scruff, plataforma de encontros voltada a homens gays, ele escolheu a imagem como a principal.

“É um jeito de manifestar apoio à vacinação e deixar claro que sou contra o atual presidente. Serve para afastar negacionistas e atrair pessoas imunizadas”, acredita.

Estratégia semelhante foi adotada pelo professor Rogério do Nascimento, de 44 anos, que tem um perfil no mesmo aplicativo. Ele mudou o apelido usado por lá para “vacinado total”. “As pessoas estão curiosas em relação à vacina e acabam puxando papo sobre o assunto.

Tem uns que dão uma de sommelier. Quando isso acontece, faço questão de dizer que tomei a dose disponível no posto”, conta. “Mas também já peguei gente mentindo, dizendo que tomou o imunizante de uma marca numa primeira conversa e, depois, citando outra.”

Se a carne é fraca, Paulo Petry deixa um último recado: encontrar-se num local aberto, como um parque, usando máscaras e mantendo o distanciamento pode ser uma alternativa para quem está exausto da vida entremeada por telas luminosas. Só tem um problema: “Pode ser difícil resistir e não passar disso. Principalmente, se o encontro for bom”.

As informações são do Jornal O Globo.

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