Diretor prepara série sobre homoerotismo no futebol: ‘Último bunker da heteronormatividade’

Márcio Debellian vai apresentar 'o olhar de um homem gay que gosta do esporte' para esse universo específico

O diretor, produtor e roteirista Marcio Debellian é movido pelo afeto. Tudo que ele se mete a realizar precisa, antes de tudo, fazer seu coração bater forte. Futebol é um assunto que o fascina. Ainda mais um aspecto específico desse esporte: o homoerotismo. É sobre o tema que o diretor tem se debruçado ao desenvolver seu próximo projeto, a série “Futebol fora de linha”.

— O futebol masculino é o último bunker da heteronormatividade. É um vespeiro. Já houve lei proibindo negro e mulher no futebol e isso foi superado. Nunca foi escrito que não era permitido gay, ainda sim, não há. Na Austrália, nos Estados Unidos ou numa segunda divisão até tem. Mas não existe um jogador gay assumido nas principais ligas europeias e latinas. E, se tem, a estrutura dá um jeito de expelir. Há um cinturão que não permite que isso ocorra — observa o diretor. — Às vezes, os jogadores se assumem depois que param de jogar, ou como o Richarlisson, que se assumiu bi mas depois de ter jogado muito tempo. O filme entra nessa dinâmica, nesse costume, nessa impossibilidade.

O projeto, em fase de desenvolvimento e com o apoio da Rio Filme, é o olhar de um homem gay que gosta de futebol para esse universo específico, explica o diretor, casado há dez anos com o designer Pedro Colombo.

— A ideia é fazer essa diferenciação do que é homofobia, coisa grave, violenta e que mata, e do que é homoerotismo, o desejo contido, e esses acordos tácitos que permitem que o futebol tenha uma dinâmica própria, silenciosa, com regras não escritas.

Conhecido pela sensibilidade de seu trabalho, Debellian também precisa de um ingrediente específico na hora de escolher pessoas cuja vida vai abordar nos filmes, documentários, shows, livros e demais projetos com os quais se envolve: admiração.

Foi assim com Maria Bethânia, protagonista de “Fevereiros”, documentário que rodou sobre a religiosidade da cantora, que também é personagem, ao lado da professora Cleonice Berardinelli, de outro filme dele: (“O vento lá fora”), retrato do poeta Fernando Pessoa a partir de leituras de poemas do autor pelas duas.

Foi assim também com Zélia Duncan, sobre quem rodou “Minha voz fica”, documentário sobre o processo de criação do disco homônimo da cantora em homenagem ao repertório da compositora Alzira E. E com Marina Lima, de quem organizou o livro “Maneira de ser”, em que ela mostra aspectos importantes no seu percurso, no campo pessoal e como artista.

— Se eu pudesse escolher duas palavras pelas quais tento trabalhar são beleza e alegria. Para mim, são elas que levam os projetos adiante — conta Debellian. — As pessoas de quem falo tocam a minha vida. Estabeleço uma troca artística mesmo que seja solitária, um diálogo da minha vida com a obra da pessoa.

A cantora, compositora e atriz Letrux, por exemplo, é alguém que o interessa pela postura no palco e também pela de cidadã. Por isso, ele rodou o documentário “Viver é um frenesi”, que estreia na próxima quarta-feira (15), no Estação Botafogo, no Rio de Janeiro. O filme acompanha o isolamento da artista em São Pedro da Aldeia, na Região dos Lagos do Rio de Janeiro, para onde ela se mudou quando ficou impossibilitada de trabalhar e pagar o aluguel durante a pandemia de Covid.

Para Debellian, amigo da cantora há 15 anos, Letrux é uma “artistona”. O diretor lembra a primeira vez que a viu cantando (o repertório de Alanis Morissette) na casa de uma conhecida em comum, quando pensou: “Que mulher interessante”. A partir daí, passou a acompanhar e a documentar momentos da carreira dela. Com esse lugar de fala, ele afirma que Letrux “saiu da bolha do Rio de Janeiro” para alçar voos bem maiores.

— Ela tem uma plateia apaixonada, que sabe todas as letras e lota shows onde ela vai. Criou um público interessado no que compõe, escreve, em seu pensamento. Está indo bem em Portugal, onde o distribuidor quis espalhar o filme comercialmente porque enxerga que ela é diferente. É uma percepção de quem a vê hoje, pronta — afirma.

O diretor também se dedica à volta do Parque de Ideias, na Biblioteca Parque, no Centro do Rio. Idealizado por ele, o projeto inclui uma programação gratuita de shows, cursos e palestras. O imortal Ruy Castro ministra a aula inaugural no próximo dia 20. No dia seguinte, a jornalista Flavia Oliveira indica dez livros que não podem faltar numa biblioteca em conversa com o público. Em 22 de março, Frejat faz show.

Com informações do Jornal O GLOBO.

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