Pobreza menstrual: sancionada há 1 ano, lei que garante distribuição de absorventes segue sem implementação

Sancionada há 1 ano pelo governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), a Lei nº 6.779/21, que garante a distribuição de absorventes higiênicos para estudantes da rede pública e mulheres em situação de vulnerabilidade, ainda não foi implementada. Movimentos sociais cobram urgência na execução do texto. As informações são do g1.

A lei foi publicada no Diário Oficial do DF em janeiro de 2021. Segundo a norma, o item deve ser entregue a mulheres e adolescentes de baixa renda, nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e escolas da rede pública. Apesar de já estar em vigor, a lei não é praticada, porque falta regulamentação.

Segundo o GDF, está sendo constituído um grupo de trabalho intersetorial, que inclui as secretarias de Saúde, de Educação, da Mulher, de Desenvolvimento Social e de Justiça, para discutir e organizar as questões necessárias à implementação da lei.

Entre os assuntos estão os recursos financeiros, logística, e critérios relativos à distribuição, público-alvo, periodicidade de entrega e monitoramento. No entanto, o Executivo não deu prazo para início da aplicação da medida.

Movimento Girl Up arrecada absorvente para doar às meninas e mulheres em situação de vulnerabilidade — Foto: Arquivo pessoal

Pobreza menstrual

No Brasil, o tema da pobreza menstrual ganhou destaque quando o presidente da República, Jair Bolsonaro, vetou a distribuição gratuita de absorventes para estudantes de baixa renda de escolas públicas e pessoas em situação de rua ou de extrema vulnerabilidade.

A decisão foi publicada no Diário Oficial da União (DOU), em 7 de outubro de 2021. Bolsonaro argumentou que o texto do projeto não estabeleceu fonte de custeio. A medida gerou indignação e resultou em manifestações por todo o país.

Dados de pesquisas realizadas pelo movimento Girl Up, que realiza ações de conscientização sobre o tema, mostram que uma em cada quatro meninas não têm acesso ao item. Já informações da Fundação das Nações Unidas para a Infância (Unicef) apontam como o problema existe no Brasil e no mundo. Veja abaixo:

No Brasil, 1,5 milhão de pessoas que menstruam vivem em casa sem banheiro.
No Reino Unido, 48% das meninas e mulheres sentem vergonha de estarem menstruadas.
Na Colômbia, 45% desconhecem a origem do sangue e 20% o considera sujo.
Na Índia, 71% desconhece a menstruação até a menarca (primeira menstruação).
Estima-se que uma mulher gaste entre R$ 3 mil e R$ 8 mil ao longo de sua vida menstrual com absorventes.

“Esse assunto começou em 2020, quando meninas do Brasil inteiro discutiram sobre não ter um produto essencial, que é o absorvente, em cestas básicas. A gente descobriu que existe imposto em cima dele, o que o torna mais caro e muitas pessoas não conseguem comprar”, diz a presidente do Girl Up Malala do DF, Yasmin Ariadiny, 22 anos.

Ela conta que vivenciou falta de estrutura nas escolas públicas do DF na adolescência. “Eu estava menstruada, fui usar o banheiro e não tinha porta. Foi constrangedor. Quando falamos em pobreza menstrual, entra a falta de água, falta de porta nas escolas, falta de produtos de higiene básicos para uma pessoa que menstrua”, ressalta.

O texto da Lei nº 6.779/21 é de autoria da deputada distrital Arlete Sampaio (PT-DF) em conjunto com o movimento Girl Up. Yasmin lembra que todo o trâmite do projeto até a sanção foi rápido, porém, não esperava que a implementação demoraria tanto tempo.

“Pressionamos o governo o tempo todo, mas não tivemos nenhuma resposta. Conversamos com parlamentares, secretários de Saúde e nada. As pessoas que menstruam precisam ter esse acesso logo”, ressaltou.

Para Arlete Sampaio, os dados demonstram a importância de assegurar absorventes higiênicos para meninas que estudam nas escolas públicas e, muitas vezes, faltam às aulas por falta do produto.

“Uma família que ganha um salário mínimo e tem três, quatro mulheres em casa, todas usando absorvente higiênico, não tem condições de adquiri-los. O sentido da nossa lei é assegurar que as UBSs possam oferecer a essas mulheres, da mesma forma, as escolas públicas, para as meninas que menstruam”, diz a parlamentar.

Ela destaca que reservou orçamento para a aquisição de absorventes este ano. “Esse é nosso apelo para que o governador regulamente a lei e possa colocar em prática.”

Mobilização

Para a coordenadora do movimento Juntas-DF, Tatiane Novais, 35 anos, o atraso na implementação da lei é grave. Com a pandemia da Covid-19, a necessidade de quem precisa aumentou ainda mais.

“A situação de pobreza menstrual foi potencializada, porque temos várias pessoas em situação de vulnerabilidade, desemprego, e esse projeto de lei é importante. Isso impacta na vida dessas pessoas”, destacou.

O movimento realizou ações em outubro do ano passado para arrecadar absorventes na Rodoviária do Plano Piloto. A ação resultou na doação de aproximadamente 200 pacotes do produto.

Fundadora do BSB Invisível, Maria Baqui, 24 anos, destaca que a distribuição gratuita de absorventes deveria ser um direito de todas as pessoas que menstruam. O projeto também arrecada e doa o produto de higiene pessoal.

“Tem mulheres que recebem durante nossas ações, que ficam tão felizes quanto quando estão recebendo uma cesta básica, por exemplo. Para quem tem acesso fácil a isso é algo corriqueiro, do cotidiano. Mas para outras pessoas, é como se fosse um motivo de comemoração. Não deveria ser. Isso faz falta para as mulheres”.

Além dos prejuízos morais, Maria destaca que a falta de absorvente pode gerar problemas de saúde, já que quem precisa recorre a outros meios, como papelão, folhas de árvores, entre outros, além de evasão escolar.

“A escola não conversa, não instrui e não distribui. A menina fica sem ir para a escola e fica sem sair naquele período, porque tem vergonha, acha que é algo incomum, que é um doença. As pessoas se viram como dá para não fazer aquele fluxo vazar”, diz Maria.

Campanha

Sem a regulamentação da lei, a Secretaria de Justiça do DF (Sejus-DF) realiza campanha de arrecadação de absorventes para distribuir para meninas e mulheres em situação de vulnerabilidade.

A ação começou no ano passado e já arrecadou 150 mil unidades de absorvente. Os pontos de coleta estão nas unidades do Na Hora e Procon.

Sair da versão mobile