Mortes de gestantes crescem mais de 40% em 2021, apontam dados da Saúde

Foram registrados mais de 2,7 mil óbitos. Especialistas creditam aumento à pandemia de Covid-19

O número de mortes de mulheres grávidas ou até 42 dias após o parto cresceu 41,9% no Brasil no ano passado em relação a 2020, segundo dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde.

O aumento dos óbitos, provocado pela pandemia de Covid-19, deixa o Brasil ainda mais longe da meta de reduzir a mortalidade materna, um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU).

O painel do Ministério da Saúde mostra que o país vinha registrando uma queda nos óbitos de gestantes e puérperas entre 2017 e 2019 — este último com 1.575 mortes. No entanto, em 2020, com o início da disseminação do coronavírus, a situação mudou: foram 1.964 mortes, uma alta de quase 25%. Já em 2021, o número saltou para 2.787.

O ano passado ainda mostrou uma inversão nos motivos dos falecimentos. Entre 2017 e 2019, as mortes diretamente ligadas a causas obstétricas, como hipertensão e sangramentos, predominavam. Já em 2021, as indiretas, como doenças do sistema respiratório e circulatório, ultrapassaram, somando 1.737 casos — contra 982 por causas diretas e 68 por causas não especificadas.

As informações são da CNN, que procurou o Ministério da Saúde para comentar os números e aguarda um retorno.

O obstetra e pesquisador do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), Marcos Nakamura, explica que as gestantes e mulheres após o parto se mostraram um grupo de risco para a Covid-19.

“Desde o H1N1, a gente sabe que essas infecções respiratórias graves têm uma possibilidade de afetar desproporcionalmente as mulheres grávidas. Por que isso? A grávida, por conta das mudanças no organismo, acaba tendo uma capacidade pulmonar reduzida. O pulmão é afetado, isso faz com que rapidamente descompense, levando a um quadro de insuficiência respiratória”, relatou à CNN.

Segundo o médico, que também é presidente da Comissão de Mortalidade Materna da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), os dados do Sivep-Gripe (Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe, do Ministério da Saúde) indicam 461 óbitos de gestantes com diagnóstico confirmado de Covid-19, em 2020, e 1.519, em 2021.

“Em 2019, a razão de mortalidade materna é de 58 óbitos a cada 100 mil nascidos vivos. Em 2020, 72 a cada 100 mil nascidos vivos. Em 2021, deve ficar acima de 100”, colocou, lembrando que o Ministério da Saúde ainda pode fazer pequenas correções nas estatísticas.

A Razão de Mortalidade Materna é um índice que expressa o número de mortes de gestantes ou mães até 42 dias após o parto por 100 mil nascidos vivos. Em países desenvolvidos, ela fica em torno de 10 por 100 mil nascidos vivos.

Marcos Nakamura também conta que outro efeito do coronavírus causa impacto sobre as gestantes.

“Além da questão respiratória, tem um distúrbio inflamatório, aumenta a chance de trombose. E a grávida ou a mulher que teve o parto tem uma predisposição a ter essas complicações, especialmente de trombose, em relação à população normal”, colocou.

Já o diretor médico da Maternidade Escola da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Jair Braga, pontua que a pandemia prejudicou o acompanhamento pré-natal das gestantes, fundamental para a identificação de problemas e comorbidades, devido ao cancelamento de consultas e o medo de contaminação nos hospitais e consultórios.

“As grávidas demoraram um pouco para entrar no grupo de risco da Covid. E depois que entraram, ficaram”, colocou.

Diante dos números, ambos os médicos ressaltam a importância das mulheres gestantes receberem a vacina contra o coronavírus.

Como chegar à meta da ONU para 2030?

Com a melhora do cenário epidemiológico da pandemia, os olhares se voltam para como melhorar o atendimento e chegar à meta de 30 mortes por 100 mil nascidos vivos, até 2030.

Para Jair Braga, o pré-natal precisa ser seguido à risca. As consultas de acompanhamento, segundo o médico, servem para identificar problemas como hipertensão e diabetes, algumas das principais causas de mortes.

O diretor médico da Maternidade Escola da UFRJ também defende a qualificação dos profissionais de saúde. “É um desafio muito grande, principalmente nas cidades que têm menos recursos”, colocou.

O pesquisador do IFF/Fiocruz, Marcos Nakamura, ainda argumenta a necessidade da ampliação de UTIs obstétricas, a melhora do encaminhamento de gestantes de risco e a resolução de problemas de infraestrutura enfrentados em alguns hospitais.

“A pandemia veio escancarar alguns problemas que já eram crônicos na rede de atenção”, avalia.

 

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