Glaidson Acácio: o ex-garçom e ex-pastor que virou o milionário ‘faraó dos bitcoins’

O autorretrato de Vincent Van Gogh, um dos maiores pintores do pós-impressionismo, chama a atenção ao ser visto pendurado ao lado de Glaidson Acácio dos Santos, de 38 anos, numa das raras fotos do ex-garçom na internet, antes de ser preso no último dia 25 pela Polícia Federal. Glaidson, que ficou conhecido como faraó dos bitcoins na Região dos Lagos, suspeito de montar um esquema financeiro fraudulento bilionário, utilizando criptomoedas, afirma num vídeo do YouTube: “Odeio ostentação”. No entanto, num dos cômodos de sua luxuosa mansão no Condomínio Moringa, um dos mais caros de Cabo Frio, cujos imóveis não saem por menos de R$ 9 milhões, é possível perceber o ápice do seu capricho: um outro retrato, só que do próprio Glaidson.

Preso numa outra residência de luxo na Barra da Tijuca, durante a Operação Kryptos da Polícia Federal, em conjunto com o Ministério Público Federal, a Receita Federal e a Procuradoria da Fazenda Nacional, Glaidson é investigado, principalmente, pelo crime contra o sistema financeiro nacional. Também são listados outros delitos: gestão temerária, organização criminosa e lavagem de dinheiro. No primeiro caso, a quadrilha atuaria como um banco, embora os integrantes, os chamados “consultores”, prometessem investir o dinheiro no esquema conhecido como Ponzi, quando se aplica o dinheiro no investimento, sem a necessidade de indicar outras pessoas para o negócio.

— A proposta dele era a rentabilidade de 10% ao mês, só que ele nem sempre fazia as aplicações. Imagina um gerente de banco levando o dinheiro para casa? — explicou o delegado federal responsável pelo caso, Guilhermo de Paula Machado Catramby, no dia da operação, quando foram arrecadados R$ 15,3 milhões em dinheiro vivo na casa de Glaidson, além de 21 carros de luxo apreendidos com o grupo.

Desde que o ex-garçom foi preso, a pergunta que tem sido feita é: como um homem com pouca instrução conseguiu ficar milionário no mercado financeiro? De família humilde, seu primeiro endereço foi a Praia do Siqueira, um bairro de pescadores artesanais de camarão, em Cabo Frio. Ele morava ao lado da comunidade do valão. Glaidson não tem o nome do pai na carteira de identidade. A mãe, Sônia Acácio dos Santos, de 55 anos, empregada doméstica, foi quem criou os cinco filhos sozinha:

— Criei cinco filhos com muita dificuldade, com muitas faxinas, passando roupa. Até picolé e empada na praia vendi para criar meus filhos, e tenho muito orgulho disso, graças a Deus! — contou Sônia ao GLOBO, que disse que irá provar a inocência do filho. — Não consigo nem mais dormir com ele preso.

O lado forte de Glaidson sempre foi o carisma. Algo que exercitou com a molecada do Siqueira, onde era tido como popular. Cansou de ver os pescadores entrarem na praia, saindo para pescar, com a lama de esgoto pelo pescoço.

— Sempre foi muito trabalhador, desde os 9 anos — lembrou a mãe, que não quis falar sobre sua vida escolar.

Sônia justificou seu medo em falar da família: teme que isso possa ser usado em trotes que vem recebendo.

— Estou recebendo vários trotes. Gente se passando pelo meu filho perguntando se tenho dinheiro em conta. Minha família recebendo ligações, mensagens como se fosse eu, porque clonaram meu número. Estou vivendo um inferno desde que meu filho foi preso. Não quero mais falar.

Glaidson passou a frequentar a Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) quando ainda era jovem, até decidir fazer o curso de missionário da congregação. Um pouco depois, foi ser garçom. Chegou a trabalhar em quiosques da Orla Bardot, em Armação dos Búzios.

Em 2013, deu serviço como garçom num resort na cidade, de acordo com uma ação trabalhista que tramitou na 1ª Vara do Trabalho de Cabo Frio. Em maio de 2015, ele entrou na Justiça contra o hotel, queixando-se por não ter recebido pelas horas de descanso que não havia tirado, no pouco mais de um mês em que trabalhou lá.

A Justiça do Trabalho deu ganho de causa a Glaidson, que recebeu R$ 4.764,59 de indenização. Ao ser perguntada sobre o caso, a gerente do resort informou que a política do estabelecimento é não falar sobre ex-empregados, nem sobre decisões referentes a reclamações trabalhistas.

Por ironia, seis anos depois do resultado judicial a seu favor, o ex-garçom foi preso acusado de movimentar R$ 38 bilhões, de acordo com o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), durante as investigações da Operação Kryptos.

A assessoria de imprensa da Igreja Universal não confirmou a formação de Glaidson depois do curso de missionário. Mas, em outro processo, desta vez movido pela igreja contra 11 ex-pastores acusados pela instituição religiosa de desvio de dízimos e de ofertas dos fiéis, em 25 maio deste ano, a instituição afirmou que Glaidson foi pastor por 15 anos, inclusive na Venezuela. A defesa da igreja não quis falar mais sobre o caso.

O ex-garçom, enquanto pastor, viajou para vários países das Américas. Numa das viagens, de 2008 para 2009, conheceu a mulher, a venezuelana Mirelis Yoseline Diaz Zerpa. Para uma pessoa próxima do casal, foi ela quem o iniciou no mundo dos bitcoins. Mirelis, que está foragida, sempre teve conhecimento do mercado financeiro, até ser colocada numa lista negra de investidores, segundo uma fonte de Cabo Frio:

— Ele é a cara do negócio. Fala a linguagem do povo e veio de uma classe baixa. Sabe se comunicar. Mirelis entrou com o conhecimento, e ele com a captação.

De fato, num vídeo feito por Glaidson como CEO e fundador da GAS Consultoria, empresa que, segundo ele, trata de “educação financeira tecnológica”, ele atrai investidores com sua linguagem simples sobre um assunto tão árido que é o investimento em bitcoins, apesar de cometer alguns erros no português.

Ele fez a gravação depois da reportagem do Fantástico, há cerca de três semanas, sobre as investigações da polícia a respeito do suposto esquema da organização criminosa. A Polícia Federal chegou a interceptar um telefonema na semana em que a equipe da TV Globo tentou falar com Glaidson em Cabo Frio. Ele reclamou com o chefe de sua segurança, mandando, inclusive, que usasse a arma para conter a equipe.

Na cidade de Cabo Frio, Glaidson é visto como um homem generoso. Muitas pessoas investiram com seus consultores, depositando suas economias. No entanto, durante as interceptações telefônicas, autorizadas pela Justiça, feitas pela PF, descobriu-se que ele estava prestes a fugir e que o esquema iria desmoronar, o que antecipou a Operação Kryptos.

Depois de trocar a lama da Praia do Siqueira pelo luxuoso Condomínio Moringa, de Cabo Frio, onde moram empresários milionários, Glaidson, que não tem curso superior, está preso na Cadeia Pública Joaquim Ferreira de Souza, no Complexo de Gericinó.

As informações são do Yahoo.

Sair da versão mobile